Desenhos experimentais
Para que um programa de análise de QTLs tenha sucesso é preciso que os marcadores moleculares estejam em desequilíbrio de ligação com os alelos segregantes nos locos que influenciam as características fenotípicas. Isso pode ser conseguido por diversas maneiras. Apenas algumas delas serão mostradas aqui, a título de exemplo. Para situações especiais outros desenhos eficientes podem ser também adotados. Os esquemas apresentados abaixo são de um organismo hipotético que tem apenas três pares de cromossomos e que não apresenta recombinação, para facilitar a visualização.
1. Segregação em F2
Nesse desenho experimental, uma geração de indivíduos F1 será produzida a partir de duas linhagens diferentes que tenham sido endocruzadas, para assegurar que os indivíduos que gerarão F1 tenham a grande maioria de seus locos em homozigose. Em F2 os alelos segregarão conforme o esquema abaixo:

Nesse tipo de desenho, as mesmas características do desenho com segregação em F2 são utilizados, mas os indivíduos F1 são cruzados com indivíduos de uma das linhagens parentais. A diferença básica entre esse desenho e o anterior é que, dentre os indivíduos que serão analisados, há apenas homozigotos para alelos que estavam na linhagem com a qual os indivíduos F1 foram cruzados ou heterozigotos.

A tecnologia de QTLs apareceu no momento em que diversos programas de análise de cruzamentos estavam em vias de execução. Além disso, certos organismos não podem ser sujeitos a esquemas de cruzamento previamente determinados (ninguém pensaria em um programa de cruzamentos planejados para a espécie humana, ou existem ainda espécies muito sensíveis a endocruzamentos sucessivos). Para todos esses casos, podem ser utilizados desenhos experimentais especiais mas todos dependem da disponibilidade de marcadores em desequilíbrio de ligação com genes que possam ser responsáveis pelos efeitos fenotípicos de interesse. No caso da espécie humana, um grande número de famílias pode ser analisada onde, em cada uma delas, a premissa do desequilíbrio de ligação pode ser admitida sem problemas. Muitas criações de animais usam intensamente o método de inseminação artificial. Dessa forma o desenho experimental deve ser centrado na análise dos reprodutores e de seus descendentes.
Análises estatísticas dos resultados
Esse é um dos pontos mais delicados do estudo dos QTLs, pois vários fatores devem ser levados em consideração. Como simplificação, vamos excluir quaisquer fatores ambientais por enquanto, imaginando que todos os organismos do experimento desenvolveram-se em um ambiente idêntico. Em segundo lugar, vamos admitir que existe uma densidade muito alta de marcadores, de tal forma que para cada um dos genes que tem efeito no fenótipo de interesse existem muitos marcadores próximos e, principalmente, que eles estejam distribuídos uniformemente. Também vamos admitir que a amostra é muito grande. A tabela abaixo ilustra o que aconteceria, no caso do desenho experimental de retrocruzamento caso um QTL fosse detectado:



Efeitos ambientais
Muitas vezes, não é possível controlar as condições ambientais completamente, como seria o desejado. Nesse caso, é importante que os efeitos do ambiente sejam minimizados, para podermos detectar apenas os efeitos dos genótipos. Suponha que, no estudo de cruzamentos entre plantas, a amostra consista em um conjunto de colheitas que ocorreram em anos diferentes. Todos sabem que existem anos "bons" e anos "ruins". Para desprezarmos o efeito dos anos podemos fazer um teste estatístico que mede o quanto cada um dos anos influenciou na média dos efeitos fenotípicos. Para isso o teste de análise de variância é empregado. Esse teste também é conhecido como ANOVA (do inglês "ANalysis Of VAriance"). Com ele podemos verificar qual foi o efeito médio de cada ano e, antes da análise associada aos genótipos, desprezar esses efeitos, subtraíndo-os. Outro caso em que esse teste pode ser empregado é aquele em que a amostra de animais seja obtido de fazendas diferentes. Também podem ocorrer combinações de anos diferentes com fazendas diferentes, mas a análise de variância pode também ser aplicada em três ou mais vias.
Efeitos de dominância, heterose e epistasia
Esses são os efeitos que prejudicam a previsibilidade dos programas de estudo que envolvem genética quantitativa clássica. A verificação dos efeitos de dominância dependem fortemente do desenho experimental, como podemos ver pela comparação dos desenhos de segregação em F2 e de retrocruzamento. A heterose necessariamente resulta de interações entre alelos diferentes nos mesmos locos ou entre locos. É um efeito que resulta da contribuição de genomas diferentes que ocorrem simultaneamente nos híbridos. O efeito heterose é empregado com sucesso há muito tempo para aumento de produção e de outras características desejáveis, portanto seria muito importante dissecar o efeito heterótico em seus componentes de heterosigozidade e epistasia. A verificação de epistasia normalmente é realizada apenas após a verificação de efeitos de QTLs individuais onde apenas aqueles QTLs que produzem efeitos significativos são testados para epistasia. Isso não necessariamente é verdade, já se demonstrou em certos estudos que genes sem efeito individual detectável podem interagir entre si com enorme efeito combinado. Mas o grande problema de se verificar efeitos de interação entre genes é a necessidade de amostras muito grandes. Para entendermos isso, imaginemos que em um determinado desenho experimental possam ser analisados três genótipos para cada loco. Para a análise de cada loco vamos supor que se optou para ter cerca de 30 indivíduos de cada genótipo, fazendo um total de 90 para a amostra como um todo (isso é um pouco absurdo pois a probabilidade de ter proporções iguais em genética raramente é satisfeita, mas podemos pensar nisso a título de simplificação). Para ter um poder estatístico equivalente, a análise de interações entre dois locos exigiria 3X3 combinações. Nesse caso a amostra saltaria para 270 indivíduos. Para interações entre três locos esse número chegaria a 810, quase dez vezes o necessário para o estudo loco por loco!
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